Você se desconecta de quem pensa diferente de suas opiniões?

Podemos dizer que os tempos atuais nos trouxeram grandes desenvolvimentos capazes de propiciar uma vida em comunidade mais cômoda e feliz, mas, ao mesmo tempo, constatamos um fenômeno triste que é a briga por opiniões, chegando muitas vezes às vias de fato. Não se trata de uma maior discussão de ideias, mas da não aceitação de posições divergentes, que ocorre muitas vezes sem ouvir os motivos e explicações do outro. Pesquisa Reuters/Ipsos de janeiro/2017 verificou que um em cada seis americanos parou de falar com um parente ou amigo próximo por causa da eleição norte-americana de 2016. Não tenho conhecimento de igual investigação no Brasil, mas pelo que observo os números podem ser equivalentes.

 O problema atual de muitos países, e talvez do mundo, é o cultivo da “Cultura do Desprezo”. Os cientistas sociais definem o desprezo como a raiva misturada com a repulsa.  Nas palavras de Arthur Schopenhauer, filósofo do século XIX, o desprezo é a “pura convicção de que o outro não vale nada”. Temos hoje normalmente as pessoas divididas em dois lados polarizados: cada um acha que é movido pela benevolência, ao passo que o outro lado é mau e motivado pelo ódio. Dessa maneira, nenhum dos lados está disposto a negociar ou fazer concessões. Isso se aplica aos republicanos e democratas nos EUA, aos palestinos e israelenses ou aos bolsonaristas e petistas no Brasil.

Arthur C. Brooks é professor de Políticas Públicas e de Negócios da Harvard University, além de colunista do jornal “The Washington Post, e escreveu o livro “Ame seus inimigos: Como as pessoas decentes podem salvar a civilização da cultura do desprezo”, o qual indico para quem desejar se aprofundar no tema deste artigo. Segundo ele, acreditar que seu inimigo é motivado pelo ódio leva ao desprezo. O desprezo busca exilar os diferentes depreciando, humilhando e ignorando.

Segundo a Associação Americana de Psicologia, a sensação de rejeição, que uma pessoa vivencia após ser tratada com desprezo, “aumenta a raiva, a ansiedade, a depressão, o ciúme e a tristeza” e “reduz o desempenho em tarefas intelectuais difíceis”. O desprezo não é danoso apenas para a pessoa que é maltratada, ele também é danoso para a pessoa que despreza, porque isso faz com que secretemos dois hormônios do stress – o cortisol e a adrenalina. A consequência de secretar constantemente esses hormônios – o equivalente de viver sob stress constante e significativo – é assustadora, chegando a diminuir a perspectiva de vida.

Ainda segundo Brooks, nossa cultura, especialmente nossa cultura política está tomada pelo desprezo. Por outro lado, pesquisas mostram não ser isso que a grande maioria de nós quer: viver em constante estado de ódio e divergências. Porém, como um alcoólatra que deseja parar de beber e não consegue, pessoas cedem ao hábito ao participarem do ciclo de desprezo na maneira como tratam os outros. Fazemos de tudo para confirmar o viés de que os caras do outro lado não apenas estão errados como são burros e maus. Conhecendo a nossa fraqueza, líderes divisivos de cada lado buscam poder e fama, alimentando a discórdia e colocando cada vez mais uma facção contra a outra.

As mídias sociais intensificam nosso vício ao permitir que vivamos dentro de “bolhas” nas quais todos pensam da mesma maneira. Segundo a Brookings Institution, o usuário médio do Facebook tem cinco amigos que pensam como ele para cada amigo do outro lado do esprectro político. Os pesquisadores da Universidade da Geórgia mostraram que os usuários do Twitter têm poucas chances de serem expostos a conteúdos de outra ideologia porque os indivíduos que eles seguem são politicamente homogêneos. Até mesmo no mundo dos aplicativos de paquera, os estudiosos descobriram que as pessoas se distinguem com base em afiliações políticas. Essas empresas nos dão plataformas em que somos expostos apenas àqueles que pensam parecido e onde se pode esconder no anonimato para fazer comentários odientos e virulentos aos que pensam diferente. Ou seja, paramos quase inteiramente de interagir com indivíduos que têm perspectivas contrárias.

As pessoas não estão mais construindo pontes. Passamos direto pelas perguntas que nos ajudariam a conhecer a história do outro e, em vez disso, olhamos os pontos de maior diferença e desacordo.

Há indícios de que, à medida em que fiquemos menos expostos a pontos de vistas opostos, perdemos nossas competências lógicas de seres humanos, levando a opiniões binárias extremas: “estou completamente certo, por isso você está completamente errado”.

Como descobriram os neurocientistas da Universidade Emory, a cooperação social ativa as partes de nosso cérebro associadas ao processamento de recompensas e vivenciar a exclusão ou a rejeição aciona os centros de dor.

Temos nos dias de hoje uma comunidade menos colaborativa e, portanto, mais infeliz.

Se quisermos mais unidade e menos desprezo precisamos sair da nossa zona de conforto, ir aonde não somos bem-vindos, e passar o tempo conversando e interagindo com pessoas que discordamos – não quanto a coisas leves como esportes e comida, mas quanto a questões morais difíceis. Deve-se estar atento, porém, que unidade não significa necessariamente concordância, o que se precisa é uma discordância respeitosa.

As pessoas que discordam de nós não são necessariamente imorais, elas simplesmente têm valores morais diferentes. Saber disso nos ajuda a evitar emitir pronunciamentos absolutos em questões que não são nada mais do que diferenças de opiniões honestas e legítimas, assim reduzindo o nosso desprezo pelos outros.

Para ser uma pessoa com mais repertório e argumentos não devemos ficar onde todo mundo concorda, pois assim nossas ideias nunca serão questionadas e as pessoas que discordam serão caladas aos gritos. Nem assistir exclusivamente a um canal de televisão que só diga o que se concorda ou ler um jornal com as mesmas opiniões. Isso tudo tornará nossas ideias fracas e medíocres, não fortes e seguras. Diversidade é o segredo para o enriquecimento das ideias e dos ideais, donde se conclui que construir pontes é importante porque exige que vejamos e reconheçamos a humanidade da outra pessoa, mesmo que não concordemos totalmente com ela. Isso significa ir a lugares fora de nossos círculos tradicionais e fazer o esforço de conhecer aqueles indivíduos com valores distintos. É difícil, não apenas porque precisamos encontrar os diferentes, mas também porque devemos ouvir e discutir com respeito.

Brooks propõe em seu livro algumas regras para subverter a cultura do desprezo hoje reinante:

  1. Enfrente o sistema. Recuse-se a ser usado pelos poderosos.
  2. Fuja da bolha. Vá a lugares aos quais não é convidado e diga coisas que as pessoas não esperam. (tvs, rádios, livros podcasts). Para obter o contraditório, você terá que visitar outras bolhas, que não a sua.
  3. Diga não ao desprezo. Trate os demais com amor e respeito, mesmo quando for difícil. Seu desprezo impossibilita que qualquer pessoa seja convencida, porque nunca ninguém jamais foi convencido por insultos. Além disso, você pode estar errado ao presumir que não é possível argumentar com certos indivíduos; é preciso tentar.
  4. Discorde melhor. Faça parte de uma competição saudável de ideias.
  5. Desligue-se: desconecte-se de debates improdutivos. Passamos muito tempo dedicados ao mau combate. Temos que otimizar nosso tempo escolhendo campos salutares de discussão e aprendizado.

Questionado por Arthur Brooks sobre o que fazer quando se sente desprezo, o Dalai Lama, seu mentor, respondeu: “Pratique a compaixão”.

Deseja se conhecer melhor para poder entrar em círculos diversos e praticar discussões enriquecedoras?

Entre em contato:

www.humanagente.com.br

whatsapp: (11) 99851-1275

Related Posts

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

© Todos os direitos reservados